terça-feira, 17 de fevereiro de 2009

Comemorei há algumas semanas um aniversário histórico – dez anos de celibato. Dez anos de abstinência sexual (a masturbação não conta). Dez anos sem ter relações sexuais. Sem foder, para utilizar o termo médico. Dez anos – um quarto do tempo que conto de vida, e certamente os mais longos dez anos de uma vida que me parece já bem longa. Somando a essa readquirida virgindade os dezasseis da original, vou em vinte e seis (hoje deu-me para o por extenso) anos a seco (a masturbação não conta). Faço esta revelação sem vergonha, sem embaraço; sem (pun intended) pudor. Para a meia-dúzia de pessoas que chegar a ler estas linhas, a revelação não é revelação nenhuma. A minha castidade é desde há muito um dos meus (muitos) segredos de Polichinelo. Mas nem por isso deixa de ser intrigante. Sou a pessoa mais obcecada com o seu aspecto físico que conheço. Um quilo a mais (e qualquer quilo acima dos sessenta e oito está a mais – neste momento peso setenta e dois), e começo a trepar pelas paredes (tirem as vossas concusões); dois dias sem fazer ginástica, e o meu mundo desmorona-se; espio as rugas que se vão cavando em torno dos meus olhos e na minha testa com ódio; desbasto (com uma pinça, dolorosamente) sobrancelhas que parecem determinadas a cunhalizar-me; arranco – com a mesma pinça, ainda mais dolorosamente – os pêlos que em cada vez maior número me brotam das profundezas do nariz e me orlam cada vez mais visivelmente as orelhas... É difícil imaginar mais avassaladora vaidade, ou mais inútil – tanto tempo e tanto esforço despendidos, para quê? Para confirmar, em cada vidro ou espelho que se me atravessa no caminho, que I look as good as I ever did ou as good as I possibly could (as limitações intrínsecas – estatura exasperantemente mediana, estrutura óssea pouco harmoniosa, assimetria facial pronunciada – estão para além do meu controlo)? Tanto por tão pouco... And yet, o mais intrigante (para mim) é a facilidade com que me privo (aceitemos, for the sake of argument, que pôr fim à travessia do deserto só depende da minha vontade), de coisas que para a maioria das pessoas são o alfa e o ómega da existência – amor, intimidade, sexo... Intrigante e inquietante, já que me parece ser essa renitência em aceitar a proximidade física com outras pessoas (gender irrelevant) o elemento que mais fundamente me define. Quando era miúdo, sofri – como a maioria dos miúdos – o terror de morrer sem chegar experimentar o sexo e os seus prometidos deleites. O evento funesto não de verificou: fui salvo desse destino por uma rapariga holandesa muito bonita que, por razões que a razão desconhece, me achou – pré-músculos, pré-magreza, estatura mediana, desarmonia óssea e assimetria facial notwithstanding – irresistível. A essa pioneira sucederam outras raparigas, de beleza ou fealdade variáveis mas nunca extremas (não muitas: o cômputo total não ultrapassa a dupla dúzia), que os meus dúbios encantos (potenciados por doses imensas de álcool) atraíram ao meu desolado covil. Uma década depois da última colisão, dou por mim imune ao medo de morrer em odor de santidade, sem perceber o porquê da mudança. Quando, no início deste ano, tive o meu meltdown, um dos meus pavores foi o de vir a emergir das profundezas do inferno para descobrir que tinha passado quarenta anos in the closet – dar por mim maricas. Não aconteceu (alívio), e essa certeza coincidiu com a clara sensação de que a próxima década seria de triunfal regresso ao activo. Experimentei uma semana de exuberante hipersensibilidade aos atributos de todas as raparigas que me passavam sob os olhos: a tesão era tanta (e tão inconveniente) que me senti obrigado a suspender o meu no-underwear pledge, e devo ter batido mais punhetas nesses seis ou sete dias que nos seis ou sete meses anteriores... Hélas (ou não – e esse é o problema), voltei entretanto ao normal – a estaca zero em todos os campos próxima ou distantemente relacionados com sexo. Há-de ter sido a crise de meia-idade mais curta e menos produtiva da história. Todos os sinais da minha vaidade voltaram, tão exigentes em tempo e esforço e tão absurdos como antes. Emocionalmente (hesitei antes de escrever a palavra), reencontrei o meu ponto de equilíbrio – umas fracções de grau acima do zero absoluto. Remiguelizei-me, voltei a ser eu, sem crises nem sobressaltos, engraçado, inteligente, generoso, encantador, gélido (ou, mais propriamente, frígido. Mas custa-me esta sensação inelutável de estar a privar-me (ou a permitir-me ser privado) do que realmente conta...

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