sábado, 28 de fevereiro de 2009

Uns segundos, e já não sentimos vontade de rir

Para as meninas do (outro) Ovo, eis Snake em toda a sua glória

Cá está, imortalizado em celulóide digital, inevitavelmente guilhotinado para salvaguarda da sua privacidade, o autor destas linhas. Apreciem-se o volume e a definição musculares, o impecável gosto sartorial, a harmonia da composição, as mãos entregues aos dois grandes prazeres na vida do ofídio - o fumo e a masturbação...

I made this (put me out of my misery)

“Eu sou a ressurreição e a vida. Quem crê em mim, mesmo que tenha morrido, viverá para sempre”. Triunfo da vida sobre a morte, da esperança sobre o medo… Eis o milagre de Cristo, milagre que a cada Páscoa sentimos dar-se em nós: examinamos a consciência, experimentamos a contrição, aceitamos as austeridades da Quaresma, entregamo-nos a uma vida mais próxima do ideal a que aspiramos, o da mensagem de Cristo. Não tardaremos a viver, Sexta-feira Santa, a Paixão; ansiamos por Domingo de Páscoa, pelo júbilo da esperança renovada…

Pelo mundo fora, de Roma a Fátima, da Etiópia ao Líbano, da Arménia ao México, da China à Austrália, milhões de pessoas reflectem por estes dias no dogma fundamental da sua Fé – o de que, três dias depois de ter sofrido na cruz a morte, Jesus Cristo ressuscitou, abrindo à Humanidade, com o rolar da pedra do Santo Sepulcro, as portas da Salvação na vida eterna. Na base desta crença que se sobrepõe a tudo o que – essencial ou de pormenor – distingue as muitas correntes do Cristianismo, está um facto histórico: o de que, algures entre os anos 26 e 36 da nossa era, um homem que se proclamava filho de Deus, Messias, e conquistara com a sua subversiva mensagem de fraternidade e esperança uma multidão de seguidores, foi condenado por blasfémia e por desrespeito às autoridades romanas, e crucificado em Jerusalém durante a Páscoa. Ponhamos de lado os livros de História, voltemos os olhos para a Bíblia. Diz-nos São Lucas que, à pergunta do tribunal judaico – “És tu o Messias, o filho de Deus bendito?” – Jesus deu a resposta que sabia equivaler à morte. Inquirido por Pilatos, o prefeito romano da Judeia, não lhe deixou alternativa: sim, era rei (de um reino que não era daquele mundo); deprezara a possibilidade que Pilatos lhe oferecera de ter a vida salva… Era uma ameaça tanto para os sumo-sacerdotes do Sinédrio como para Tibério, imperador de uma Roma que viria a tornar-se sinónima de Cristianismo… A morte era o seu destino, e do modo mais infamante: na cruz, ladeado por ladrões… Que assim fosse. Era esse o desígnio, o propósito último, a chave que faria a humanidade compreender o sentido dessa verdade que Pilatos famosamente ignorava… Filho de Deus, Messias, Jesus oferecia a quem o quisesse, homem ou mulher, poderoso ou humilde, livre ou escravo, o mais cobiçado dos tesouros, o bem supremo – a vida eterna sob o olhar de Deus. Não era subversiva, era revolucionária, a mensagem de Cristo. É em memória desses três dias que abalaram o mundo que se enchem do rumor das preces e do fervor da crença, na comunhão com o Salvador, templos pelo planeta inteiro. E, nos corações de milhões de fiéis, nenhuma súplica é por estes dias conturbados mais ardente que a súplica pela Paz...

Foram essa súplica e a esperança que na Páscoa sentimos renascer em nós e à nossa volta que inspiraram a edição 2009 do Ovo Anual em Porcelana de Edições Petra. Apresento-lhe o projecto original do nosso bem conhecido Egypton Navarro para o belo Ovo deste ano: num céu azul recamado de estrelas, voa um bando de pombas brancas – símbolo universal dessa Paz por que tanto ansiamos… O seu exemplar ser-lhe-á remetido dentro de três semanas, salvo indicação em contrário da sua parte. O preço é de 60 €, liquidável, tal como de costume, em três pagamentos mensais de 20 €, debitados directamente no seu cartão VISA. Aplica-se, como sempre, a nossa garantia de quinze dias de satisfação-ou-recolha.

Desejo-lhe, a si, caro amigo, e aos seus, uma Santa e muito feliz Páscoa.

Cordialmente,

Ernst Hoffmann

quarta-feira, 18 de fevereiro de 2009

The Birthday Party: Swampland

The Birthday Party: memória descritiva

Animação garantida para qualquer festa. Um slow romântico para os os casalinhos apaixonados, e um blues com muito shake para pôr tudo a dançar. Enjoy!

The Birthday Party Jenifer's Veil

terça-feira, 17 de fevereiro de 2009

No pussy Blues

Comemorei há algumas semanas um aniversário histórico – dez anos de celibato. Dez anos de abstinência sexual (a masturbação não conta). Dez anos sem ter relações sexuais. Sem foder, para utilizar o termo médico. Dez anos – um quarto do tempo que conto de vida, e certamente os mais longos dez anos de uma vida que me parece já bem longa. Somando a essa readquirida virgindade os dezasseis da original, vou em vinte e seis (hoje deu-me para o por extenso) anos a seco (a masturbação não conta). Faço esta revelação sem vergonha, sem embaraço; sem (pun intended) pudor. Para a meia-dúzia de pessoas que chegar a ler estas linhas, a revelação não é revelação nenhuma. A minha castidade é desde há muito um dos meus (muitos) segredos de Polichinelo. Mas nem por isso deixa de ser intrigante. Sou a pessoa mais obcecada com o seu aspecto físico que conheço. Um quilo a mais (e qualquer quilo acima dos sessenta e oito está a mais – neste momento peso setenta e dois), e começo a trepar pelas paredes (tirem as vossas concusões); dois dias sem fazer ginástica, e o meu mundo desmorona-se; espio as rugas que se vão cavando em torno dos meus olhos e na minha testa com ódio; desbasto (com uma pinça, dolorosamente) sobrancelhas que parecem determinadas a cunhalizar-me; arranco – com a mesma pinça, ainda mais dolorosamente – os pêlos que em cada vez maior número me brotam das profundezas do nariz e me orlam cada vez mais visivelmente as orelhas... É difícil imaginar mais avassaladora vaidade, ou mais inútil – tanto tempo e tanto esforço despendidos, para quê? Para confirmar, em cada vidro ou espelho que se me atravessa no caminho, que I look as good as I ever did ou as good as I possibly could (as limitações intrínsecas – estatura exasperantemente mediana, estrutura óssea pouco harmoniosa, assimetria facial pronunciada – estão para além do meu controlo)? Tanto por tão pouco... And yet, o mais intrigante (para mim) é a facilidade com que me privo (aceitemos, for the sake of argument, que pôr fim à travessia do deserto só depende da minha vontade), de coisas que para a maioria das pessoas são o alfa e o ómega da existência – amor, intimidade, sexo... Intrigante e inquietante, já que me parece ser essa renitência em aceitar a proximidade física com outras pessoas (gender irrelevant) o elemento que mais fundamente me define. Quando era miúdo, sofri – como a maioria dos miúdos – o terror de morrer sem chegar experimentar o sexo e os seus prometidos deleites. O evento funesto não de verificou: fui salvo desse destino por uma rapariga holandesa muito bonita que, por razões que a razão desconhece, me achou – pré-músculos, pré-magreza, estatura mediana, desarmonia óssea e assimetria facial notwithstanding – irresistível. A essa pioneira sucederam outras raparigas, de beleza ou fealdade variáveis mas nunca extremas (não muitas: o cômputo total não ultrapassa a dupla dúzia), que os meus dúbios encantos (potenciados por doses imensas de álcool) atraíram ao meu desolado covil. Uma década depois da última colisão, dou por mim imune ao medo de morrer em odor de santidade, sem perceber o porquê da mudança. Quando, no início deste ano, tive o meu meltdown, um dos meus pavores foi o de vir a emergir das profundezas do inferno para descobrir que tinha passado quarenta anos in the closet – dar por mim maricas. Não aconteceu (alívio), e essa certeza coincidiu com a clara sensação de que a próxima década seria de triunfal regresso ao activo. Experimentei uma semana de exuberante hipersensibilidade aos atributos de todas as raparigas que me passavam sob os olhos: a tesão era tanta (e tão inconveniente) que me senti obrigado a suspender o meu no-underwear pledge, e devo ter batido mais punhetas nesses seis ou sete dias que nos seis ou sete meses anteriores... Hélas (ou não – e esse é o problema), voltei entretanto ao normal – a estaca zero em todos os campos próxima ou distantemente relacionados com sexo. Há-de ter sido a crise de meia-idade mais curta e menos produtiva da história. Todos os sinais da minha vaidade voltaram, tão exigentes em tempo e esforço e tão absurdos como antes. Emocionalmente (hesitei antes de escrever a palavra), reencontrei o meu ponto de equilíbrio – umas fracções de grau acima do zero absoluto. Remiguelizei-me, voltei a ser eu, sem crises nem sobressaltos, engraçado, inteligente, generoso, encantador, gélido (ou, mais propriamente, frígido. Mas custa-me esta sensação inelutável de estar a privar-me (ou a permitir-me ser privado) do que realmente conta...

sábado, 14 de fevereiro de 2009

E, para demonstrar que nem tudo o que para aqui escorre é ficção, eis dois poderosíssimos elementos de prova - Garbageman, original demolidor, e Fever, versão arrebatadora e elogio fúnebre supremo e supremamente comovente ao génio e à danada mas enorme alma (mahatma) de Lux Interior

P.S.: o Expresso, sempre eructante de informação inútil, fez-me o favor de me pôr a par do nome autêntico do artista falecido, nome que por respeito me abstenho de aqui reproduzir. Lux para sempre!

Fever

Garbage Man

Fever

Acabo de descobrir, folheando bocejante o bocejante “Actual” do Expresso (o caderno formerly known as “Cartaz”), que morreu (com a inverosímil idade de 62 anos) o grande Lux Interior, vocalista (ou cantor, para quem tenha, como eu, uma noção ampla, amplíssima, do conceito de “cantar”) dos Cramps. Estilisticamente, acaba de me dizer a wikipedia, os Cramps faziam (frequentemente em simultâneo e delirante caos) garage punk, punk, trash rock, rockabilly e, acima de tudo, psychobilly (“Psychobilly is a genre of rock music that mixes elements of punk rock, rockabilly, and other genres. It is often characterized by lyrical references to science fiction, horror and exploitation films, violence, lurid sexuality, and other topics generally considered taboo, though often presented in a comedic or tongue-in-cheek fashion”, informa a wikipedia ), o estilo em que mais longe o seu génio (essencialmente o do grande Lux) atingiu o zénite. Tenho meia-dúzia de álbuns deles (incluindo um par de compilações), material mais que suficiente para conhecer o melhor do muito (muitíssimo – mais prolíficos, ou mais prolixos, só para aí os Fall) que produziram ao longo de uma carreira (termo a tomar também na mais vasta das acepções) de mais de trinta anos. Socorrendo-me da definição de “psychobilly”que há pouco surripiei, é-me fácil demonstrar como se lhe adequa o corpus crampi – “My Daddy Drives a UFO” (sci-fi); “Human Fly”; “I Was a Teenage Werewolf”; “Zombie Dance” (horror); “Can Your Pussy Do the Dog”; “You’ve Got Good Taste”; “Hot Pool of Womanneed” (exploitation, violence, lurid sexuality). De “other topics considered taboo” também não há escassez no cânone crâmpico, desde o canibalismo à coprofagia, do incesto ao parricídio. Em boa verdade, o tabu era o território deles. E se também é verdade da boa que o seu viscoso rasto pelos domínios do interdito tresandava a gozo, não o é menos que, no seu melhor (1979 – 1983), sob o riso e as piadas de quase sempre péssimo gosto, havia uma corrente muito forte e perturbadora de ameaça, medo e demência que os aproximava muito mais dos Birthday Party/early Nick Cave (ou, mais recentes, os Gallon Drunk) que de palhaços como os Reverend Horton Heat ou Zombina and the Skeletones (to name but two, que a lista de assholes whose dream is to be the next Cramps é infindável). And man, could they rock! Não que soubessem tocar (ou cantar, como deve ter ficado claro); a risível incompetência técnica,o absoluto desconhecimento dos instrumentos, o total desprezo pelas noções de harmonia, ritmo, melodia, tom ou quaisquer outras que integrem o mais rudimentar currículo conservatorial, pelo menos nos primeiros anos, eram não só mais que manifestos, como também – nesse aspecto, de acordo com a mais rigorista ética garage-trash-punk – orgulhosamente ostentados. That was not the point. E qual era o point? Bom, antes de mais, sexo, em doses maciças, cavalares, exposto de modo insuperavelmente boçal e grosseiro, sob todas as formas e em todas as configurações – da punheta ao sadomasoquismo à orgia the-more-the-merrier; depois, a celebração do amor ilimitado e genuíno pela trash-culture americana – dos hambúrgueres e drive-ins, carros com barbatanas e gajas com mamas enormes, aos filmes sub-série-Z, literatura pulp, revistas porno, freak e peepshows… enfim, se era inteiramente alheio à mais remota ideia de bom-gosto, bom-senso, inteligência, relevância social ou política; se suava, arfava, fumegava, fodia, fedia, desgostava, escandalizava, repugnava ou induzia vómitos, então era temática do domínio da crampologia. Eram os John Waters do rock (com a diferença de que o John Waters sucks – cock and gas). Eram também um dos melhores grupos da história do rock: três das suas “canções” originais estão entre as mais fenomenais que alguma vez ouvi ou ouvirei: TV Set, Garbageman, Thee Most Exalted Potentate of Love – e isto significa que as ponho a par do que de melhor fizeram os velvet Underground, os Joy Division ou os Sonic Youth. E depois, há as versões – Strychnine, Tear It Up, Fever, superiores a todas as outras que conheço (incluindo o Fever clássico da Peggy Lee – that’s how good they were). A partir de 1983 (ano do Smell of Female, ao vivo, fabuloso, e do Off the Bone – compilação com o absolute best, para quem ache que one dose of the cramps is enough), as coisas entraram na rotina. O Date With Elvis ainda quase makes the grade, mas o resto (ainda que invariavelmente haja uma ou outra jóia entre o pechisbeque) é refugo, feito para pagar o spandex, as tintas para o cabelo e o verniz para as unhas, alguma comida e quantidades industriais de droga. O bom do Lux não deixou um cadáver bonito, mas só porque não morreu novo (os Cramps clássicos tinham todos, senão beleza – estou a pensar no Bryan Gregory e no Nick Knox –, certamente sub-z-movie star looks, no caso do vocalista tema deste texto já longo; quanto à guitarist-cum-dominatrix Poison Ivy, era simplesmente de pasmo), e não morreu novo porque nada é mais americanamente trashy que uma puta gasta e desbocada. Possa a tua alma, Lux, contorcer-se eternamente de prazer nas chamas do Inferno.

segunda-feira, 9 de fevereiro de 2009

Lebowski

Tenho em casa, desde há duas semanas, uma impressora. É um belo objecto (um paralelepípedo quase cúbico) em plástico negro mate que, como o tapete do Lebowski, really ties the room together. Estou muito satisfeito com a aquisição: não só custou (instalação incluída) uns míseros/meros 150 euros, como, tendo eu dispensado a emissão da correspondente factura, fiquei em contrapartida dispensado de esportular outros 30, correspondentes ao que julgo ser um imposto chamado IVA. A “máquina”, como o gajo que ma instalou insistia em chamá-la, é a laser, e imprime fotografias com excelente qualidade. Só ainda não percebi bem para que me vai servir. Já fiz, a pedido da minha Mutti (os seus desejos são ordens), algumas cópias de fotos da minha sobrinha Mariana. A crítica foi unanimemente elogiosa. Já imprimi uma lista de livros que tenciono (money and time permitting), respectivamente comprar e ler. Devo ter imprimido umas dez páginas, no total. Não levando em linha de conta o custo do papel, cada página custou-me até agora 15 euros. Sou um teso que não tem onde cair morto: 15 euros por página is a little too rich for my blood. Por isso, ontem, lembrei-me de que poderia tentar começar a amortizar a máquina com a impressão de pornografia. Imagens de gajas boas, na Internet, não faltam. Da resma de folhas que tenho em casa (uma resma = 480 folhas) sobram-me ainda 470. São muitas gajas boas, muitas punhetas potenciais à espera de implementação. O problema está nas fotografias que encontro. A primeira candidata de que me lembrei foi a Jessica Biel. É uma artista de grande talento, e gosto muito de vê-la trabalhar. Escrevendo “jessica biel” no google imagens, não é preciso ir além da primeira fornada para encontrar pano para muitas mangas... But there’s (pun intended) a rub: impressas as fotos, criado um ambiente de trabalho ergonomicamente adequado (um panóptico, digamos), esbarro na dúvida tremenda: porque é que uma rapariga assim haveria de contorcer-se langorosamente com os olhos cintilantes de desejo pousados em mim? A inteligência ou o bom-senso (you choose which) dizem-me que as probabilidades de isso alguma vez acontecer são ténues, senão ínfimas. Ain’t gonna happen. E a punhetinha tão ansiada não chega a ser implementada. E não adianta alterar os parâmetros da procura: brancos e negros, os corpos que vêm dar à minha costa (por razões misteriosas, os fotógrafos têm uma marcada preferência por praias) são invariavelmente perfeitos, luzidios de água salgada e óleos perfumados, coleantes em marés baixas, reclinados sobre rochas quentes e polidas; nos rostos de impossível simetria, o desejo é murmurado por lábios entreabertos mostrando dentes de impecável brancura, o prazer prometido por olhos semicerrados no antegozo de longos enlaces que só orgasmos de perfeita sincronia quebrarão. Deslocado, só poor old me. É a maldição do masturbador inteligente... Vou ter de ficar à espera que algum nerd inspirado crie o site plausibleporn.com. Já gostei mais do paralelepípedo quase cúbico negro mate que really ties my room together...

sábado, 7 de fevereiro de 2009

O Aviador

O “piloto do Hudson” – o herói que conseguiu pousar o seu avião nas águas do rio Hudson, salvando assim 150 pessoas de um destino pior que a morte, não desaparece das manchetes da imprensa americana:
“Weeks after starring in his own story of bravery and heroism, the pilot who safely ditched his jetliner in the Hudson River received a standing ovation Saturday from the audience at a Broadway performance of “South Pacific”.
At the end of the classic revival, the show’s stars introduced Capt. Chesley “Sully” Sullenberger as the pilot who set down the disabled plane within reach of rescue boats last month, saving the lives of all 155 people. A spotlight was trained on Sullenberger in the audience, and the crowd stood, cheered and applauded. The pilot’s wife, Lorrie Sullenberger, began wiping tears from her face. He hugged her, then turned back to the crowd and waved as the cheers grew still louder. The 58-year-old pilot, his wife and their two daughters went backstage after the show and met the cast of the Rodgers and Hammerstein musical, which tells of the romances and heroics of a group of American aviators, nurses and sailors stationed far from home during World War II.
It was an appropriate choice for Sullenberger, who was named best aviator in his Air Force Academy class and served in the military from 1973 to 1980. He flew F-4 Phantom II fighter planes and served as a flight leader in Europe and the Pacific.”
Eu, se fosse o Sully, tinha cuidado. Tanto interesse na sua vida, na sua família, na sua carreira... Tantos jornalistas a “investigarem”, tantos amigos e conhecidos a “testemunharem”... Não hão-de tardar a biografia autorizada, o movie of the week, talvez o blockbuster com o Harrison Ford (que já pilotou o Air Force 1) aos comandos... 58 anos, ainda casado com a noiva original, duas filhas, uma folha de serviços militar que não se limita a ser sem reparo, e um registo na aviação civil agora coroado com uma arriagem perfeita... Ó Sully, quem julgas tu que enganas? Eras o melhor pilotinho da academia e gostas de musicals? Tens duas filhas? De qual gostas mais? E a tua Lorrie, aposto que a chorar está ela habituada... Já agora, tens-te lembrado de declarar os teus rendimentos? Seriamente, já há-de haver quem se pergunte se alguém pode ser imaculado. Nascido por volta de 1950, o nosso Sully tinha 30 anos quando pegou nos comandos de um avião de passageiros: hospedeiras e aviadores, mile-high club... Não há um marido ou colega ciumento, uma co-worker despeitada ou traumatizada por assédios importunos? Para onde voou o Sully? Paraísos fiscais nas Caraíbas, ou então Colômbia, Bolívia, México? O mundo gosta de heróis, mas o que saboreia realmente é o espectáculo que dão quando estão tombados na sarjeta. Até o nome “sully – to make soiled or tarnished, to defile”, prenuncia a queda... Não dou ao herói do Hudson mais que uns meses até a lama começar a salpicar-lhe o nome; ainda o verei – e não sentirei senão pena, enquanto murmuro “I told you so”, claro – a pedir desculpa ao mundo por não ser perfeito...

Yerself is steam

Bem sei que ninguém quer saber, mas pu-la aqui na mesma. O grupo – a banda – dava pelo nome de Mercury Rev (um foguetão Mercury em pleno lift-off, ou então um motor fora-de-borda Mercury em plena aceleração... whatever). Words fail me. Estar à beira-mar em Phuket a ver a rebentação no dia 26 de Dezembro de dois mil e não sei quantos deve ter sido parecido. Listen at your peril. A ideia veio-me do blast from the past com que começou hoje o meu dia – um friend request de uma rapariga que não vejo há dez anos mas que nunca pude esquecer (o adjectivo “unforgettable” foi criado with her in mind). It’s not time for these fears of mine, e depois o mundo explode, e quem não sentir um arrepio na espinha e um desejo irresistível de se lançar para o mosh pit não tem alma... Em toda a sua incandescente glória, lovingly dedicated to Barbara, eis “Chasing a Bee”.

sexta-feira, 6 de fevereiro de 2009

Todos os nomes

Uma coisa que eu acho que é importante e não está bem é os nomes. Há montes de pessoas que os nomes são iguais. Só Anas e Sandras conheço eu para para cima de umas vinte, Anas Margaridas, Anas Cristinas, Anas Marias (e Sandras igual). Só aqui no trabalho hão-de haver algumas seis ou sete Anas. Quer dizer, se fizessem um filme só devia de ter uma Ana e uma Sandra; se houvesse duas que o nome fosse igual, era logo vai haver uma confusão qualquer com estas gajas. Eu sou Rui Fernando, mas toda a gente me chama Nando, fora no trabalho, que sou Rui. Da família, só a minha esposa é que não, é mesmo Fernando e não gosta nem um bocadinho de Nando. E um amigo meu que é Luís e a mãe e a irmã mais nova são as duas Idalina, e a irmã mais velha é Deolinda e tem uma filha que é a sobrinha dele e também é Idalina e o filho, que eu fui o padrinho, também é Rui. Tenho outro amigo meu, que é o Paulo, que antes de se casar com uma que é Carla, teve namoro com três que eram todas Carla. E por aí afora. Nos filmes não é assim e nos livros também não pode ser, porque senão ninguém percebia nada. Tem-se que mudar os nomes, senão é uma confusão. Outra coisa importante é os palavrões. O meu pai era humilde, mas não gostava de palavrões, e a minha velha então, alto lá, quando eu alçava a grimpa era logo. O meu pai nunca me levantou a mão mas também não era preciso, mas digo palavrões. Quando comecei aqui no trabalho, as pessoas só diziam palavrões quando estavam só gajos, ou só gajas, por exemplo, ou então em Inglês (eu falo um bocadinho). Eu dei a volta a isso, tipo tudo a tomar café no primeiro andar (que depois acabou, porque o patrão afinava, mas também não se podia fumar, portanto por mim...) e eu vá de contar uma anedota mais pró picante, mas sem exagerar demais, só na reinação que eu não gosto de ofender ninguém. E os outros era logo a avacalhar. Mas voltando aos palavrões é mesmo assim que as pessoas falam (e o patrão tenho a certeza que é igual, só que à nossa frente é que não). Se o Miguel Esteves Cardoso, que tem estudos (eu não tenho derivado que tive de começar a trabalhar quando o meu pai faleceu, mas a quase que acabei o liceu) pode fazer um livro que é O Amor é Fodido eu também posso mandar umas bojardas. E em relação às gajas igual e aos paneleiros e aos pretos. Há um no DN que é o Manuel Ribeiro que é só cartas de gajas a dizer mal, mas gostam e, as que dizem mal lêem, senão como é que sabiam. O que eu quero dizer é que há porradas de mulheres que escrevem livros que as mulheres lêem. A Rita Ferro, a Margarida Rebelo Pinto, a esposa do Freitas do Amaral e uma que é a Bobone e mais uma porrada delas fartam-se de fazer papel. O que eu acho é que se funciona com mulheres também funciona com homens. Eu sei que os paneleiros e as mulheres é que lêem mais livros, por isso um gajo que quiser escrever um livro como os que as gajas lêem mas para os homens também não pode abusar demais, porque senão depois ninguém compra. Eu achava que escrever era difícil, mas até nem está a ser e acho que o meu livro até agora é bom. Um aqui que tem estudos, para escrever uma cagada dum folheto é só enciclopédias e dicionários e internet e o diabo a quatro e na volta o patrão não gosta, mas também com o patrão é sempre assim. As pessoas é que pensam que escrever é difícil mas é porque nunca experimentaram... Mas há livros que ninguém compra fora intelectuais, ou intelectuais da treta, mas nem me acredito que os lêem. Há livros que depois são feitos filmes, tipo a Firma ou o Cliente ou o Advogado do Diabo que eu não li os livros mas vi os filmes e o escritor é o mesmo mas como são todos sobre advogados, ele teve trabalho para um e ficou com a papa feita para os outros fora a história que é diferente. E o Stephen King igual, nem me acredito que tem trabalho fora a história, que é a vantagem do sobrenatural. Eu também não estou para me matar, que já chega ter que escrever e não gosto de sobrenatural nem de ficção científica (que mesmo assim tem-se que ter uma grande imaginação, lá isso também não vou negar). Li os Lusíadas, que não gostei mas lá que é bem escrito é. Os Maias do Eça de Queiroz gostei. E li mais uma catrefada deles (as Viagens na Minha Terra, e outro que era a Família Inglesa e mais outros que agora não me lembro, mas acho que o que gostei mais ainda é os Maias). E em inglês também li alguns. Portanto até acho que li mais livros que muita gente, só que não sou é nenhum intelectual. O dos folhetos é só palavras caras e vírgulas, tem a mania das vírgulas, mas se o patrão não espirra também não sou eu que vou dizer nada. Mas lá português sei (e inglês), só que não é assim que as pessoas falam, fora intelectuais e mesmo assim é cada uma que até dói, mas prontos.

quarta-feira, 4 de fevereiro de 2009

Se te queres matar, porque não te queres matar?

Os dias iam passando, que é o que fazem os dias... O Miguel – o outro, o meu amigo (um aparte: na ficção, quase nunca há duas personagens com o mesmo nome, a menos que seja para tarde ou cedo gerar um engano rico em consequências dramáticas. Na vida real, por outro lado, o número de nomes distribuídos parece ridiculamente pequeno: uns bons 50% das raparigas que conheço chamam-se Ana; Miguéis, somos mais que as mães... olha, rimou) passou por minha casa e deixou-me, a conselho da irmã, médica (outra das raras não-Anas), uma caixa de comprimidos de valeriana (500mg) de comprovados efeitos ansiolíticos. Atirei-me a eles como um lobo; funcionavam. Comecei a dormir outra vez, a conseguir sair de casa sem ter de me apoiar em paredes, corrimões, sinais de trânsito e carros estacionados para não desmaiar. No Dia da Fruta, o Sr. Jorge achava-me melhor cara (mas continuava a deitar-me olhares furtivos para ter a certeza de que eu não lhe caía redondo no estabelecimento); no Minipreço, já não metia conversa com os clientes e as meninas da caixa; na rua, já não falava sozinho em voz alta (pelo menos era o que me parecia). A coisa compunha-se. Fui ao Maló para a primeira de muitas e financeiramente ruinosas consultas. Comportei-me exemplarmente. Fui trabalhar pela primeira vez em quase três semanas. O Sr. Hoffmann manifestou satisfação pela minha convalescença. Fiquei comovido, mas não chorei – nada mau. Nesse mesmo dia (8 de janeiro), decidi-me enfim a folhear a Internet, para poder pôr um nome na lápide do inimigo vencido. Podia ter-se tratado de uma de duas coisas, parecia: ou tinha tido uma crise de pânico ou sofria de doença bipolar. A segunda hipótese tinha um poor outcome, pelo menos sem tratamento médico pesado e doses cavalares de lítio. Optei pelo mal menor – ataques de pânico: what ifs, quase desmaios, palpitações... batia certo. A valeriana, no entanto, era afinal um placebo, e deixou imediatamente de produzir qualquer efeito; o passeio que tentei dar no dia seguinte (também a conselho da irmã do Miguel, que tinha posto a hipótese de que o problema fosse a chamada “seasonal affective disorder” – acrónimo “SAD” – e tinha sugerido banhos de Sol à beira do tejo) foi desastroso. Tinha passado do pânico ao terror. Os diques tinham cedido de vez, e a torrente dos medos tinha arrasado tudo o que se atravessara no seu caminho: depois de ter por milagre chegado ao Terreiro do Paço, precisei de apanhar um táxi para voltar a casa. A contemplação do rio (“beautiful but boring”, como dizia o outro) tinha gerado uma ideia fixa – a de como deveria ser bom estar morto. Paz e sossego. Nem medo, nem desejo. A Wikipedia chama ao fenómeno “suicidal ideation”: é uma bela expressão. No meu caso, era um regresso ao passado: entre os 18 e os 21 ou 22 anos, eu não tinha feito outra coisa; a diferença era que agora, tendo os meus pais em Lisboa, seria fácil, com um verdadeiro arsenal à minha disposição a 5o metros de casa (o meu pai coleccionou armas durante muito tempo, e tem-nas às dezenas). Meter uma bala na câmara, enfiar o cano na boca - a experiência é desagradável: o metal é frio, sabe a óleo e cria uma sensação semelhante à que se tem quando se toca com a língua no pólo de uma pilha, mas a fracção de segundo entre o premir do gatilho e o nada não deixa tempo para arrependimentos - nada de what ifs... Perfect. Quem decidisse ficar por cá que se amanhasse.